Santiago, capital do Chile, está se transformando no novo Vale do Silício da América do Sul. Há três anos o governo chileno lançou um programa para atração de empreendedores de qualquer canto do mundo que estivessem criando novas empresas ainda em estágio embrionário na área de tecnologia. Batizou o programa de “Start-up Chile” e, em pouquíssimo tempo, recebeu e instalou mais de 300 pequenas empresas. A prefeitura de Santiago oferece incentivos fiscais, network para obtenção de capital e integração com as universidades locais para fornecimento de mão de obra. O próprio presidente do Chile, Sebástian Piñera, declarou que, com o programa, em breve o país terá o maior polo de inovação do mundo.
O que aconteceu no Chile muito dificilmente seria reproduzido no Brasil. Não temos políticas de apoio ao empreendedor inovador, figura hoje muito disputada por governos de países que sabem reconhecer a importância do desenvolvimento tecnológico, como o Chile o faz. Aliás esta é uma das mais importantes explicações para o fato de estarmos tão atrasados em desenvolvimento tecnológico e produção de inovações.
Pouco estímulo ao inventor ou inovador explica porque o país é bom em ciência mas ruim em tecnologia
A melhor medida para esta produção é o número de patentes registradas no organismo internacional que faz esse registro, a USPTO. No ano passado, o Brasil ali registrou apenas 500 patentes o que significou menos de 0,25% das 200 mil patentes que foram registradas por todos os países. Com isso não estamos nem entre os 30 maiores produtores de inovação do mundo. Interessante que esta não é a situação da ciência no Brasil que, por sinal, é quase sempre produzida dentro da universidade. Nesse caso já somos responsáveis por quase 3% da produção científica mundial estando entre os 12 países que mais produzem ciência no mundo.
Por que somos relativamente bons em ciência mas muito ruins em tecnologia? Existem várias razões mas uma das mais importantes está no pouco estimulo ao inventor ou inovador para que ele possa ter seu negócio e se tornar um empreendedor. Para alguém se transformar em empreendedor no Brasil vai ter que superar inicialmente a barreira da burocracia que nos coloca como um dos países onde é mais complicado e difícil se abrir uma nova empresa já que o tempo médio para isso é de cinco meses.
Aliás capacidade empreendedora tem tudo a ver com a micro e pequena empresa, pois o indivíduo que é dono de uma boa ideia ou de algo inovador se dirige ao mercado inicialmente criando sua microempresa. E na verdade se existe um segmento empresarial que nunca teve apoio real nesse país esse segmento é o das micro e pequenas empresas. Apesar de serem 99,1% do total das empresas brasileiras e gerarem 60% do total dos empregos, são responsáveis por menos de 20% do nosso Produto Interno Bruto (PIB). Ou seja, elas não têm a menor importância no contexto geral da nossa economia.
Em qualquer país do mundo elas recebem atenção especial e proliferam incubadoras para ensinar aos novos empreendedores a arte de gerenciar sua pequena nova empresa. As incubadoras na maioria das vezes fazem parte de universidades e se destinam a abrigar por um a três anos as empresas nascentes para que elas não morram antes da hora. Israel por exemplo tem quase 400 incubadoras e 7 milhões de habitantes enquanto São Paulo, a maior cidade do Brasil, com seus 11 milhões de habitantes, tem apenas uma incubadora que é o Cietec, localizado dentro do campus da USP, faz um trabalho excepcional mas é único.
Em parte devido a essa falta de incubadoras, a verdade é que não existe um intercâmbio saudável entre o mundo acadêmico e o empresarial em nosso país. Ao mesmo tempo em que a universidade brasileira precisa ser parabenizada pela produção crescente e expressiva de seus docentes, que permitiu o lado positivo das estatísticas referentes à produção científica, é a mesma universidade que não consegue e não sabe se relacionar com as empresas brasileiras para lhes prover tecnologia como acontece em outros países grandes produtores como EUA, Inglaterra, Coreia e Israel e vários outros.
Em parte devido a essa falta de incubadoras, a verdade é que não existe um intercâmbio saudável entre o mundo acadêmico e o empresarial em nosso país. Ao mesmo tempo em que a universidade brasileira precisa ser parabenizada pela produção crescente e expressiva de seus docentes, que permitiu o lado positivo das estatísticas referentes à produção científica, é a mesma universidade que não consegue e não sabe se relacionar com as empresas brasileiras para lhes prover tecnologia como acontece em outros países grandes produtores como EUA, Inglaterra, Coreia e Israel e vários outros.
Nesses países, boa parte da produção tecnológica vem das pequenas empresas e, em boa parte, elas se originaram dentro das universidades, os chamados “spin-off”. Em qualquer análise vamos verificar que no Brasil há muito por fazer para aproximar as universidades das empresas.
Claro que uma parte do problema é cultural e isso não pode ser esquecido na busca da solução. O Brasil herdou a tradição europeia do cientista como acadêmico e não o modelo americano do cientista inventor e empresário. Para um pesquisador universitário, o fato de ter ligação com a indústria é considerado prostituição pelos colegas. Lamentavelmente, o que tem impedido a solução desta questão é que em ambos os lados muitos negam a existência do problema.
Qual a saída? Incentivos para os dois lados passarem a se relacionar. Essa é uma das razões do sucesso do modelo coreano principalmente nesta área. Os professores que conseguirem fazer acordos com as empresas para desenvolverem suas pesquisas precisam ser premiados e as empresas que apoiarem a universidade merecem isenções tributárias.
Há poucos dias o Senado aprovou a criação do Ministério da Pequena Empresa e a presidente Dilma está para indicar seu titular. Este novo ministro começaria muito bem sua atuação se logo de início reconhecesse a importância do problema da falta de sintonia entre universidade e pequenas empresas e poderia perfeitamente se dedicar a priorizar a construção desta ponte.
Muitos países galgaram seu desenvolvimento calcados no suporte que suas academias deram ao mundo empresarial mas nós estamos muito atrasados nestas questões. Se queremos nos destacar como um país importante na geração de inovação então temos que reverter essa situação urgentemente.
Fonte: Jornal Valor Econômico
Paulo Feldmann é professor da FEA USP, presidente do Conselho da Pequena Empresa da Fecomércio, membro do Conselho da Cidade e diretor da Câmara de Comércio Brasil Israel.