Start-up usa inteligência artificial para combater desperdício de água

Tecnologia, informação em tempo real, estatística e inteligência artificial (capacidade de tomar decisões de acordo com regras e padrões) podem ser fundamentais no combate ao desperdício e a falta de água em São Paulo.

A afirmação é do empresário israelense Amir Peleg, 49, que criou em 2008 a start-up (empresa iniciante de tecnologia) TaKaDu.

A companhia, que recebeu investimentos da multinacional 3M em 2013, oferece software que armazena e analisa informações da rede hídrica. O objetivo é, a partir delas, diminuir as perdas de água devido a vazamentos e rompimentos da tubulação e ajudar gestores da rede a priorizar problemas e tomar decisões estratégicas.

Com atuação em nove países, a TaKaDu presta serviços no Brasil a duas concessionárias do grupo Aegea, nos Estados de Mato Grosso do Sul e Rio de Janeiro.

Marco Aurélio Silva, responsável por projetos especiais e tecnologia da Aegea, conta que a concessionária Águas Guariroba, de Campo Grande (MS), reduziu as perdas de 24% em dezembro de 2013 —quando foi assinado contrato com a empresa israelense— para 21%.

Com isso, a companhia deixou de perder cerca de 2 milhões de metros cúbicos por ano, diz.

Segundo ele, a implantação do sistema é gradual e deve ter seus resultados ampliados, levando em conta que a empresa segue investindo na instalação de mais sensores e medidores.

“É uma ferramenta complementar que ajuda a interpretar as informações que estão em nossos softwares”, diz.

Amir Peleg estará em São Paulo nesta terça-feira (27) para participar do seminário Brazil Summit 2015, promovido pela revista britânica “The Economist”, que reunirá políticos, acadêmicos e lideranças empresariais. Ele participa de painel em que o presidente da Sabesp, Jerson Kelman, falará sobre os desafios da gestão hídrica.

Divulgação
Amir Peleg, fundador e CEO do TaKaDu, start-up israelense que oferece soluções tecnológicas para economizar
Amir Peleg, fundador do TaKaDu, start-up israelense que oferece soluções economia de água

Folha – Como é possível usar tecnologia para combater a perda de água?

Amir Peleg – O que fazemos é aplicar uma análise de dados robusta em diferentes informações que as concessionárias possuem graças aos medidores que usam em suas redes.

Analisamos dados sobre fluxo, pressão, qualidade da água, nível dos reservatórios e informações sobre a localização dos encanamentos, Combinando esses dados com matemática, estatística e algoritmos, é possível detectar eventos e anomalias na rede.

Em geral, as concessionárias já tem medidores que lhes permitam obter essas informações?

Isso varia. Em grupos como Aegea, com o qual trabalhamos no Brasil, existem bons medidores. E mesmo com a Sabesp, com quem tive reuniões de apresentação, há uma boa base de dados.

Mas, em muitos lugares no Brasil, não há sensores. Acredito que essa mudança tecnológica será uma revolução, pois, se você quer enfrentar a seca e a perda de água, precisa ampliar o nível de visibilidade e conhecimento sobre o que está acontecendo na rede.

E, depois de medir, precisa analisar bem essas informações. SE você tem muita informação e não sabe o que fazer com isso, está perdendo dinheiro.

Como a informação ajuda a encontrar um problema?

Um exemplo simples: em sua rua, a análise das informações de um medidor de fluxo pode identificar o padrão de consumo, com isso você pode saber o padrão de gasto esperado. Na noite, há pouco fluxo, pois as pessoas estão dormindo. Ele aumenta às 6h da manhã e depois diminui.

Então, se você percebe que o fluxo está além do previsto, pode notar de imediato que há um vazamento em sua rua.

Além de dizer que problemas você têm, também mostramos quão grande eles são e quais deles você deve priorizar, de acordo com tamanho e localização deles.

O fato de sempre termos pensado que temos água em abundância no Brasil, apesar dos períodos de crise recentes, e de ela ser barata para consumidor, pode diminuir o interesse por tecnologias que visam eficiência?

A água não pode ser tão barata, pois assim as pessoas desperdiçam muito. Com o passar do tempo, a tendência é o preço dela aumentar no Brasil, Mesmo que não para todos.

O que normalmente você vê em outros países é que algumas pessoas recebem água gratuitamente, enquanto outras com mais dinheiro devem pagar por ela. Se você tem uma piscina, a água para enchê-la não deve ser muito barata.

Em muitos países, estão se criando diferentes faixas de preço.

Na primeira faixa, de pouco consumo, o preço é baixo. Acima disso, você paga cada vez mais caro.

Em São Paulo, as perdas de água da Sabesp costumam ficar em torno de 30%. Acredita que tecnologia poderia ajudar a reduzir esse percentual?

Poderíamos diminuir esse número pela metade. Cairia. E também é possível reduzir os rompimentos da tubulação. Se você detecta vazamentos no início, pode evitar que eles se tornem maiores.

Os argumentos mais fortes para que se invista em soluções como a sua estão mais ligados a sustentabilidade ou a resultados financeiros?

Acho que são os dois, eles andam juntos. A concessionária pode economizar muito dinheiro reduzindo perdas.

Primeiro, ela pode reduzir o gasto com produtos químicos que compram para tratamento. Se reduzirmos as perdas pela metade, isso significa muito dinheiro.

E reduz-se o gasto com energia. A água é o primeiro consumidor de energia em muitos países, em que seu bombeamento exige muito gasto

E, se você sabe quais são os seus problemas, pode decidir o que é mais importante e urgente, assim economiza dinheiro com suas equipes técnicas.

Considera que a gestão da água deve ser pública ou privada?

Voto no setor privado. Acredito que, desde que você ofereça uma boa regulação, o setor privado pode administrar este setor com eficiência.

Tiro essa conclusão quando vejo companhias privadas em países como Espanha, Reino Unido e no Brasil, e a comparação com empresas públicas.

Há caso de companhias públicas muito boas, como na Austrália. Mas o segredo lá é que a regulação é muito dura, o setor público exige que suas empresas sejam eficientes.

Por que, depois de ter sucesso em empresas digitais, decidiu iniciar uma empresa no setor de água?

Como em Israel temos muitos problemas relacionados à água, pensei em fazer algo nesse setor depois que vendi minha empresa anterior para a Microsoft, em 2008.

Naquele momento, Israel estava em uma seca. Não podíamos desperdiçar água, a conta estava muito cara, e alguém me disse que, em geral, as concessionárias perdem 30% dela.

Comecei então a pesquisar sobre o setor, a entender o que se fazia para tratar os vazamentos. E vi que as práticas ainda eram muito pobres. As concessionárias esperavam até que alguém os ligasse e dissesse que viu água na rua, para então verificarem se havia um vazamento.

Israel tem um ambiente propício para start-ups. O que faz de Israel um espaço privilegiado para o empreendedorismo?

Não acho que exista um segredo, mas sim uma combinação de muitos fatores.

Um deles é que, na mentalidade israelense, sempre se quer mudar alguma coisa, em vez de aceitá-las como elas são.

E acredito que nos últimos 30 anos, o desenvolvimento de tecnologia para uso militar, de telecomunicações e agora para a internet, criou uma nova profissão. As pessoas agora querem ser empreendedoras.

RAIO-X – Amir Peleg

Idade
49

Atuação
Fundador da empresa TaKaDu, é empreendedor desde 1991. Em 2008, vendeu para a Microsoft a companhia YaData, de tecnologia para a segmentação de clientes É chairman do fórum de redes de abastecimento hídrico inteligentes (SWAN) desde 2012

Formação
Graduado em física pela Universidade Hebraica de Jerusalém, possui MBA da escola de negócios Enseade