Paulo Feldmann explica como as características do brasileiro impactam na gestão das empresas

Durante 35 anos , o diretor da Câmara Brasil Israel de Comércio e Indústria, Paulo Roberto Feldmann, foi executivo de empresas de porte, a maior parte do tempo em multinacionais norte-americanas como Microsoft, Citibank, Iron Mountain e Ernst & Young. Conciliando desde 1981 a carreira de alto executivo com a de professor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP (FEA/USP), ele relata que um dos principais problemas enfrentados por executivos brasileiros que trabalham em companhias estrangeiras, principalmente nos Estados Unidos, é explicar como as coisas funcionam no Brasil, as características culturais que impactam na qualidade da gestão e os obstáculos que impedem o bom desempenho das empresas.

Você acaba de lançar nos Estados Unidos o livro Management in Latin America. Como surgiu a ideia do livro?

Tive uma grande vivência internacional pelo fato de ter  trabalhado e vivido em  países como  Singapura, Japão, Estados Unidos, Reino Unido, Argentina, Venezuela e México.  Minhas responsabilidades como executivo colocaram-me em contato direto com os problemas da região latino americana. Em 1998,  quando trabalhava como diretor da empresa de consultoria  Ernst&Young  fui para Singapura e Japão  aprender sobre um sistema de gestão que estava dando certo em vários países,   com o objetivo de implantá-lo na América Latina. Pelas peculiaridades das empresas e pela forma de gestão adotada na região, o projeto não deu certo deste lado do mundo. Foi  então que resolvi escrever um livro para tentar explicar por que algo que funcionava muito bem na Europa e nos Estados Unidos não dava certo na América Latina.

Qual o perfil do administrador brasileiro?

A administração é fortemente influenciada pelos aspectos culturais.  O brasileiro não tem pontualidade, não cumpre prazos (um bom exemplo é a Copa do Mundo – tivemos sete anos para planejar e executar as obras, e tudo está sendo entregue no último minuto). Ele também é muito gentil e cordial e não gosta de correr riscos. Na hora de montar o seu time, prefere escolher familiares e amigos, e nem sempre opta pelos melhores executivos.  Todos esses fatores somados dificultam uma boa gestão. É claro que também há bons aspectos: somos muito criativos, sabemos lidar com mudanças e temos  capacidade para atuar em áreas diversas.

Quais os principais problemas que dificultam a expansão do universo empresarial no país?

Os governos dos últimos anos trouxeram muitas contribuições para o país, mas faltaram investimentos em infraestrutura, principalmente em transporte e energia elétrica. Temos uma carga tributaria alta, péssima qualidade de serviços  e a mão de obra é ruim. A gestão das empresas deixa a desejar e como consequência temos baixa produtividade.  Uma pesquisa internacional avaliou a gestão de seis mil empresas no mundo, 500 delas brasileiras. O Brasil ficou em antepenúltimo lugar, na frente apenas da Grécia e da Índia.

Como diretor da Câmara Brasil Israel, você já participou de varias Missões a Israel, conte-me sobre essa experiência. O que o Brasil pode aprender com Israel ?

Israel é o país que mais desenvolve tecnologia no mundo, além de ter o maior número de patentes e de engenheiros por habitante. O Brasil precisa conhecer o modelo israelense, que é baseado nas incubadoras, onde  as pequenas empresas estão  ligadas às Universidades e são apoiadas pelo governo e pelas grandes empresas. Por outro lado, também temos que mostrar aos israelenses a importância do Brasil. Dentro desse contexto,  a Câmara Brasil Israel vem fazendo um excelente trabalho de aproximação entre os dois países. As Missões a Israel são um grande exemplo.

Como os empresários brasileiros podem empreender melhor, ser mais inovadores e ajudar nossa economia a progredir? 

Primeiro, eles têm que se conscientizar da importância da inovação, eles precisam saber que de vez em quando têm que correr riscos, têm que pesquisar e buscar novas alternativas para seus negócios, produtos e para seus processos. A taxa de inovação da empresa brasileira é uma das mais baixas do mundo e isso é muito ruim para o Brasil como um todo.

Você é professor da FEA / USP e está em contato direto com jovens que cursam Administração e Economia. Como você vê os anseios dos jovens que se formam atualmente e o que eles pensam sobre o futuro do pais?

Há uma mudança muito grande entre os jovens de hoje e os da minha geração.  Eles não estão tão preocupados em melhorar o país ou construir uma sociedade mais justa . A minha geração tinha essa preocupação talvez por ter amadurecido na época da ditadura. Os jovens hoje são pragmáticos e  estão preocupados em ter uma carreira e em ganhar dinheiro rápido.

Qual conselho você daria a um jovem em início de carreira?

Em minha opinião há duas coisas fundamentais: ser fluente em inglês e ter a capacidade de apresentar qualquer ideia  de maneira resumida (em no  máximo quinze minutos).  Uma vivencia internacional, como um programa de intercâmbio,  também é importante na carreira de um jovem.

Qual o maior desafio que você já teve em sua carreira profissional?

Um dos melhores momentos da minha carreira foi quando o Olavo Setubal,  então presidente do Itau, escolheu 20 pessoas de sua equipe para mandar ao Sillicon Valley (região na Califórnia que concentra grandes empresas de tecnologia)  por um ano. Eu  fui um dos escolhidos, e ao voltar ao país ajudei a implantar a Itautec, uma empresa de tecnologia 100% brasileira.

Algo que gostaria de acrescentar?

Acho que a economia é uma ciência muito importante, que faz parte do dia a dia das pessoas. Em minha opinião, ela deveria ser ensinada desde muito cedo nas escolas