Os impactos do prolongamento da guerra na relação comercial Brasil – Israel

O MONITOR MERCANTIL conversou com Renato Ochman, presidente da Câmara Brasil Israel de Comércio e Indústria, sobre os impactos de um possível prolongamento da guerra contra o Hamas, iniciada no último dia 7 de outubro, nas relações comerciais entre os dois países.

Quais são as principais características da relação comercial entre Brasil e Israel?

A relação comercial entre Brasil e Israel passou, especialmente nos últimos anos, por uma visível evolução. Só para que tenhamos uma ideia, hoje no Brasil, direta e indiretamente, existem 300 empresas israelenses instaladas e fornecendo serviços.

Por muitos anos, a balança comercial entre os dois países foi de, aproximadamente, US$ 1,5 bilhão, sendo que em 2022 ela subiu para US$ 4 bilhões, ou seja, quase três vezes o volume dos anos anteriores. Isso se deve aos produtos de commodities que Israel vende para o Brasil, principalmente os fertilizantes para o agro, o que faz com que a balança lhe seja mais favorável.

Isso sem contar que essa balança poderia ser muito maior, pois o setor de tecnologia não passa por ela, já que é muito difícil mensurar quanto essa tecnologia vale ou quanto ela gera de resultado para ambas as partes. Além disso, muitas empresas israelenses de tecnologia abrem o seu capital na Nasdaq, o que faz com que elas saiam do radar de Israel e passem para o radar dos Estados Unidos, o que cria mais uma dificuldade para mensurar o impacto da tecnologia israelense na balança comercial entre os dois países.


Caso a guerra se prolongue, quais seriam os impactos na relação comercial dos dois países?

O maior impacto será no setor de tecnologia, onde Israel vem incrementando, cada vez mais, a relação com as empresas brasileiras. Israel possui muitas fintechs, agrotechs e foodtechs, que trabalham com comidas desenvolvidas em laboratório, e que estão recebendo investimentos de muitas empresas brasileiras que também querem estar à frente nesse setor, além das empresas de ciência e de saúde.

Contudo, há um lado que pode manter essa relação aquecida. Israel é um grande consumidor de carne de frango, sendo que o Brasil é um grande produtor. Em setembro deste ano, Israel assinou um acordo com o Brasil, que não foi muito divulgado, onde aprovou a compra da carne de frango brasileira. Isso porque a carne em Israel tem princípios religiosos, como a questão kosher, o que faz com que nem todos os países produzam em conformidade com esses requisitos.

O Brasil foi o primeiro país a assinar esse acordo, o que pode mudar muito a relação a seu favor. Isso porque Israel é um dos maiores consumidores, se não for o maior, de carne de frango no mundo. O país consome, aproximadamente, 600 mil toneladas desse tipo de carne por ano, enquanto o Brasil produz 5 milhões de toneladas. Israel pode ser um grande comprador da carne de frango brasileira, principalmente agora que está com dificuldade para ter gente trabalhando na sua produção.

Apesar de toda a situação ruim que estamos vivenciando, há uma oportunidade de negócio para o Brasil.


Como o setor de tecnologia de Israel está sendo impactado pela guerra?

Atualmente, as empresas de tecnologia são responsáveis por 1 ⁄ 5 do PIB de Israel e empregam 14% de todos os empregados do país. São, aproximadamente, 6 mil startups, sendo que a cada dia há uma nova. Esse setor está sendo afetado porque, normalmente, essas empresas são criadas, administradas e constituídas por jovens, da mesma forma que os fundos de venture capital. Como os jovens estão sendo recrutados pelo exército, fala-se que 20%, 25% dos funcionários desse setor foram chamados na leva de 350 mil convocados.

Recentemente, eu conversei com algumas dessas empresas e vi que, de uma certa forma, elas já estão cobrindo isso. Como essas atividades podem ser feitas de casa, muitas pessoas fazem home office e continuam a desenvolver seus trabalhos. Além disso, essas empresas também estão contratando pessoas de fora de Israel para assessorar no que pode ser feito por pessoas de outros países. É importante acompanhar esse quadro interno.


Nota: Segundo o Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, em 2022 o Brasil exportou para Israel US 1,88 bi e importou US$ 2,11 bi, o que gerou um conta corrente de US$ 4 bi com um saldo desfavorável ao Brasil de US$ 235 milhões. Israel foi o 35º maior parceiro brasileiro nas exportações, responsável por 0,6% do volume total, e o 28º nas importações, responsável por 0,8% do volume total.

Os principais produtos exportados pelo Brasil foram óleos brutos de petróleo ou de minerais betuminosos (57%), carne bovina fresca, refrigerada ou congelada (13%), milho não moído, exceto milho doce (9,2%) e soja (7,4%). Pelo lado de Israel, os principais produtos exportados foram adubos ou fertilizantes, exceto fertilizantes brutos (54%) e produtos como inseticidas, rodenticidas, fungicidas e herbicidas (14%).

Nos cinco anos anteriores a 2022, a balança comercial somou US$ 1,74 bi em 2021, com saldo negativo para o Brasil de US$ 543 mi; US$ 1,45 bi em 2020, saldo negativo de US$ 596 mi; US$ 1,59 bi em 2019, saldo negativo de US$ 846 mil; US$ 1,5 bi em 2018, saldo negativo de US$ 857 mi, e US$ 1,36 bi em 2017, saldo negativo de US$ 428 mi.

Fonte: MONITOR MERCANTIL