O que Israel pode nos ensinar sobre ciência e tecnologia?

Muito prazer! Eu sou o Guilherme Tonial Neves, de 25 anos, natural de Primavera do Leste – MT, mas atualmente vivo em Dourados – MS.

Em julho de 2017, fui selecionado por meio de uma seleção online para participar da terceira edição do Programa de Inovação Transdisciplinar (TIP) da Universidade Hebraica de Jerusalém, em Israel. Passei dois meses estudando disciplinas como bioengenharia, inteligência artificial, empreendedorismo e segurança computacional.

Durante essa passagem rápida, pude aprender e conhecer um pouco sobre o ecossistema de ciência e, principalmente, como é a área de biotecnologia naquele país. Por isso, elenco alguns pontos que me chamaram a atenção e o que podemos aprender com os israelitas para melhorar a pesquisa feita no Brasil.

Com uma área e população quase equivalentes à metade do Estado do Rio de Janeiro, o país de apenas 22.145 km2 e 8,78 milhões de pessoas está em sua infância se comparado a outras nações, com apenas 70 anos de existência. Entretanto, já possui uma educação de excelência que é muito melhor do que algumas nações mais antigas! (1;2;3)

Bem-vindo a Jerusalém, a capital que conta grande parte da história do mundo e está ajudando a construir o futuro. Fonte: Rob Bye/Unplash

Cerca de 48% dos israelenses com mais de 15 anos possuem mais de 12 anos de estudos. Como um país tão pequeno, mas com alto nível educacional, Israel surpreende por apresentar alguns números interessantes em relação às ciências:

  • Um dos países que mais investe em Pesquisa e Desenvolvimento em relação ao seu Produto Interno Bruto; (4)
  • Maior número de autores publicados nos campos das ciências naturais, engenharia, agricultura e medicina; (5)
  • 11 cidadãos israelenses foram laureados com o Prêmio Nobel nas áreas de física, química, economia e paz, sendo que mais de 19% dos prêmios Nobel foram concedidos a cidadãos de ascendência judaica. (6)
Nove laureados com o Prêmio Nobel que passaram pela Universidade Hebraica. Fonte: o autor.
Conexões

Um ponto que me chamou a atenção foi o fator “conexão”, porque para conhecer pessoas em Israel me pareceu mais fácil que em qualquer outro lugar, pelo fato de que o serviço militar é obrigatório para homens e mulheres, fazendo com que o tratamento seja feito de maneira horizontal, sendo as pessoas mais acessíveis, independentemente da sua posição no trabalho ou hierarquia social.

Com isso, não há empecilhos para conhecer pessoas-chave na área de biotecnologia e encontrar parcerias e investidores para os projetos, o que facilita a realização da inovação.

Tive a oportunidade de conhecer a Nurit, uma das fundadores do Genspace (link na imagem), localizado em Nova York, um dos primeiros laboratórios de biotecnologia abertos ao público. Fonte: o autor.
Investimentos

Não adianta ter contatos se falta o “fermento” para que os projetos cresçam. Um dos  principais componentes que diferenciam Israel de outros países são os investimentos na área de ciências, principalmente em biotecnologia.

Observe o gráfico abaixo, que mostra que o total de investimentos em empresas de ciências da vida em Israel em 2016 foi de 823 milhões de doláres. Interessante que a quantia investida é contínua, logo, garante uma segurança para as empresas continuarem investindo em pesquisa e desenvolvimento.

Em 2016, foram investidos 717 milhões de dólares por  investidores estrangeiros e 106 milhões por israelenses em companhias de ciências da vida. Fonte: Adaptado de Israel’s Life Sciences Industry IATI Report 2017.
País das Startups

Com todo esse investimento, é perceptível o aumento na quantidade de empresas de ciências da vida: o número de empresas, que em 2007 era de cerca de 720, em 2016 chegou a 1.350, como mostra o gráfico abaixo.

Quantidade de empresas das ciências da vida ativas em Israel, sendo 1.350 empresas em 2016. Fonte: Israel’s Life Sciences Industry IATI Report 2017.

Esse crescimento é bem explicado no livro “Nação Empreendedora. O Milagre Econômico de Israel e o que Ele nos Ensina“, o qual demonstra como as forças armadas do país ajudaram a criar uma mão de obra altamente especializada, capaz de trabalhar com tecnologia e resiliente às pressões da vida. Com isso, a criação de startups (negócios de elevado risco e alta incerteza) cresceu de maneira exponencial, tornando o país líder em quantidade desse tipo de empresa por número de habitantes.

Com essa enorme quantidade de empresas de tecnologia, a área de biotecnologia é altamente explorada, sendo que as empresas focadas em fármacos, diagnósticos, industrial, insumos biológicos, agrobiotecnologia e bioinformática correspondem a 41% do total de empresas de ciências da vida do país.

Diversidade das empresas de ciências da vida. Fonte: Adaptado de Israel’s Life Sciences Industry IATI Report 2017.
Tripé de sucesso

Um modelo que tem gerado muito sucesso em Israel para incentivar pesquisa e inovação nas universidades é o tripé Universidade – Empresa – Sociedade. Os israelenses conseguiram organizar um esquema no qual a sociedade mostra os problemas e fornece o investimento, as universidades pesquisam para resolver esse problema e as empresas auxiliam na transformação da pesquisa em inovação, o que pode gerar lucro para o país.

A Parede dos Inovadores, uma homenagem da Universidade para aqueles professores que foram inovadores em suas pesquisas. Fonte: o autor.

Um exemplo é a empresa CollPlant, criada por um professor da Universidade Hebraica de Jerusalém, a qual produz colágeno para reparo de tecidos por meio de plantas de tabaco modificadas geneticamente que expressam essa proteína. Logo, não é necessário retirar o colágeno de animais como porcos.

Vídeo ilustrativo do processo de produção do colágeno por plantas (em inglês).

Além da sociedade sair ganhando, os professores que lideram as pesquisas também são recompensados, chegando a ganhar 60% da patente ao ser comercializada, tanto que a empresa Mobileye, criada por um professor da mesma universidade, foi a empresa com maior valor de venda para a gigante Intel.

O que levar para casa

Ao conhecer o ambiente de ciência e tecnologia de Israel, o que me chamou mais a atenção, além dos investimentos e do networking, foi o fator urgência e excelência nos projetos que eles fazem. Para tudo o que eles vão fazer, a prioridade é fazer de forma independente, sem pedir ajuda de outros países.

Depois,  não existe tempo ruim para desenvolver uma tecnologia: se há uma dificuldade, eles não ficam se lamentando. Portanto, quando há união de todas as partes da sociedade (governo, população e empresas) com o objetivo de construir uma país melhor, a ciência é tratada com prioridade e os seus resultados, apesar de serem de longo prazo, mudam a realidade e trazem melhorias para a nação.

Por isso, caro leitor, de que maneira você acredita que nós pesquisadores podemos fazer para superar as dificuldades de investimentos e continuar produzindo uma ciência de qualidade? Quais passos você acha que precisamos tomar para nos igualarmos a Israel?

Referências

(1) http://mfa.gov.il/MFA/AboutIsrael/Maps/Pages/Israel-Size-and-Dimension.aspx

(2) http://www.cbs.gov.il/reader/cw_usr_view_Folder?ID=141

(3) http://www.conexaoisrael.org/israel-em-numeros-2/2014-09-23/amir

(4) http://www.conexaoisrael.org/israel-em-numeros

(5) http://www.morasha.com.br/home.html

(6) https://www.nobelprize.org/nobel_prizes/lists/countries.html