Israel integra universidade e mercado para estimular inovação

Presidente da Acate, Daniel Leipinitz (E), Herman Richter (C), diretor da Universidade de Tel Aviv, e Sílvio Kotujansky Foto: Renato Igor / Diario Catarinense

Aplicabilidade prática, relevância acadêmica e possibilidade de retorno financeiro. Esse é o tripé de critérios que a Universidade de Tel Aviv, a maior de Israel, usa para definir em quais projetos de pesquisa irá investir. Essa visão pragmática resume bem o jeito de ser e de fazer desse país que completa 70 anos em 2018 e tem o segundo melhor ecossistema de inovação do mundo, perdendo apenas para o Vale do Silício, na Califórnia.

Uma missão catarinense de parlamentares, empresários e agentes de segurança pública esteve em Israel no início de setembro para descobrir como o país conseguiu criar um atmosfera que inspira a inovação e o surgimento de empresas de tecnologia com grande sucesso. Aplicativo de trânsito Waze, pendrive, drones, tomate cereja, dessalinização da água do mar, irrigação por gotejamento, aquecimento solar, mão artificial: a lista das invenções israelenses é grande.

Construído em meio a permanente conflito com os vizinhos da região, já que a questão palestina não está resolvida, o país nunca teve tempo a perder. O diretor de marketing da Indústria Aerospacial de Israel, Eyal Ben David, diz qual o segredo:

– Nós somos os melhores porque precisamos. O nosso diferencial competitivo é não ter nenhum recurso natural e nem um grande mercado interno.

É questão de sobrevivência. Israel precisa do avanço tecnológico para gerar renda e se proteger.

As exportações com alto valor agregado representam muito na economia do país. A estatal Aeronautic, maior empresa aeroespacial e de defesa de Israel, tem 15 mil funcionários, faturou em 2016

US$ 4 bilhões e 80% das vendas foram para o exterior. No ano passado, foram criadas 106 empresas por 206 egressos da Universidade de Tel Aviv que faturaram US$ 3,2 bilhões.

Relação entre SC e as startups israelenses

De acordo com Daniel Leipinitz, presidente da Associação Catarinense das Empresas de Tecnologia (Acate), o intercâmbio entre o Estado e Israel ainda é pequeno e poderia ser ampliado:

– O relacionamento ainda é baixo, mas já existem casos de empresas israelenses investindo em catarinenses. Um desses casos foi a compra da catarinense Suntech pela Verint, uma gigante na área da segurança, e a parceria entre a israelense SimilarWeb, de inteligência digital, com a catarinense KRP. Mas o potencial é muito maior – afirma.

Para o empresário, o país tem muitas lições para inspirar o sistema de empreendedorismo brasileiro. Um dos principais pontos é a grande capacidade de atrair cérebros:

– Israel só conseguiu se desenvolver rapidamente porque foi capaz de atrair profissionais (engenheiros, cientistas, empreendedores) de alto nível. Ainda que no caso deles existam fatores históricos importantes, sabemos que todos os principais ecossistemas de inovação no mundo possuem programas e ações sérias para atrair e possibilitar a fixação de talentos. A educação é de alto nível e focada em solução de problemas: a Universidade de Tel Aviv é considerada a nona melhor do mundo. Além disso, existe um ambiente favorável à realização de negócios: Tel Aviv tem 60 fundos de venture capital. Israel possui 350 centros de pesquisa, desenvolvimento e inovação de grandes empresas internacionais.

*O jornalista viajou a convite da Confederação Israelita do Brasil e da Acate

Autoridade Israelense de Inovação

A Innovation Autorithi é uma agência pública independente. Tem um orçamento anual de U$500 milhões. São 150 analistas de projetos. Depois da análise, um comitê decide quem vai receber investimentos. O recurso é um empréstimo: se o produto tem sucesso, a empresa que captou deve pagar 3 a 5% da receita gerada por aquele produto apoiado (até o limite do valor captado), se o produto não tem sucesso, não há que devolver. A análise do projeto leva até 3 meses. A demanda por recurso é de 6 vezes o orçamento. A IA utiliza os seguintes critérios para apoiar projetos de inovação:

Nível do risco (gostam de riscos altos)
Nível da inovação
Potencial de escalabilidade no mercado mundial
Capacidade / Qualificação do time

Panorama de Israel

Indústria Tecnológica
50% das exportações do país
10% dos postos de trabalho
15% do PIB
Salário básico no setor de tecnologia em Israel
US$ 1.300
no Brasil US$ 300
A cada US$ 1 investido em P&D pelo governo, o retorno para a economia do país é de US$ 5 a US$ 8.

ENTREVISTA: Herman Richter, diretor da Universidade de Tel Aviv para América Latina e Espanha

“A nossa universidade incentiva o sucesso, mas não castiga o erro”

O que faz da universidade de Tel Aviv um centro de excelência?
A Universidade de Tel Aviv é multidisciplinar. Os 125 centros de pesquisa, que cobrem todas as áreas do conhecimento humano, acolhem cientistas de pós-graduação de diferentes escolas e áreas de ensino que trabalham no mesmo projeto. Isso possibilita abranger um âmbito maior de experiências e conhecimentos variados e aumentar o leque da aplicabilidade do resultado da pesquisa. A nossa universidade incentiva o sucesso, mas não castiga o erro. São os dois lados da mesma moeda que é a busca intensa do saber. Existem fundos de bolsas para estudantes excepcionalmente bons. Incentivamos permanentemente a inovação. Às vezes, saber perguntar é mais importante do que saber responder. Procuramos ser relevantes aos problemas e necessidades fora dos muros do campus. Por isso, damos valor e importância à ciência aplicada, assim como se faz com a ciência pura, que é base de toda pesquisa.

A universidade tem critérios claros para seleção de projetos de pesquisa: aplicabilidade prática, relevância científica e mercado. Nunca receberam a crítica de tirar a liberdade do pesquisador?
As críticas existem e são sempre bem-vindas. Os nossos professores têm um objetivo: no final do processo de interação entre o professor e o aluno, ele deve acabar sabendo mais do que o mestre. O aluno tem a liberdade de escolher o tema, sempre e quando tenha um valor acadêmico.

Como convencer os estudantes a terem foco no mundo prático e no mercado?
Não é necessário convencer. O estudante israelense ingressa na universidade muito mais maduro e preparado para a vida real. Por razão das obrigações como o serviço militar obrigatório e pela cultura local. Os israelenses começam os estudos universitários com 23 ou 24 anos de idade.

Qual o papel do governo nos projetos de pesquisa?
As universidades israelenses são entidades públicas, sendo que 60% do orçamento depende do governo. Uma parte importante deste apoio é direcionado para pesquisa e desenvolvimento. O governo ganha junto. Quanto mais um projeto é reconhecido internacionalmente, todos ganham.

Qual a dica que o senhor dá para as universidades brasileiras que nem se aproximam da produtividade acadêmica da universidade de Tel Aviv?
Não há uma dica a ser dada. A realidade de cada país é diferente, mas, sem dúvida, dar prioridade à educação, desde a educação primária e fundamental. Incentivar o espírito inovador é primordial, dar espaço para a motivação pessoal. A Universidade de Tel Aviv tem no momento 1,8 mil projetos encaminhados para a obtenção de patentes, 70 patentes são lançadas a cada ano. Os cientistas e criadores destes produtos têm direito a 40% dos frutos.

Qual critério de valorização do professor? Como ele pode aumentar os rendimentos?
O professor não pode aumentar o salário, que é estipulado de acordo com critérios bem claros. O que ele pode mudar são os vencimentos. Muitos dos professores universitários, assim como seus alunos de pós-graduação, são unidades econômicas, negócios potenciais, verdadeiras startups. Há vários casos onde um professor e seu aluno juntaram ideias e criaram um negócio conjunto. Uma startup pode nascer desse encontro de ideias e da inexistência de fronteiras.

Fonte: Diário Catarinense