Declarações de Tombini em evento da Câmara continuam repercutindo na mídia

A palestra concedida pelo Ministro Alexandre Tombini, Presidente do Banco Central do Brasil, durante a celebração dos 55 anos de fundação da Câmara Brasil Israel, continua repercutindo na mídia nacional. Leia abaixo o editorial publicado no jornal O Estado de São Paulo sobre as declarações do Ministro quando questionado sobre a autonomia do BC.

De novo, a autonomia do BC

O comércio vacila, a indústria continua em marcha lenta e a inflação se mantém próxima de 6%, muito alta pelos padrões internacionais. Quem decide se o Banco Central (BC) deve aumentar os juros, de novo, para conter a alta de preços, ou encerrar o ciclo de alta para dar mais espaço aos negócios? No Brasil, essa pergunta é facilmente justificável num ano de eleições, porque a autoridade monetária é formalmente subordinada à Presidência da República. Prevalecerá o interesse eleitoral – partidário, pessoal e imediatista – ou o compromisso – de importância geral e duradouro – de proteger o poder de compra da moeda?

Em quase três anos e meio na chefia de governo, a presidente Dilma Rousseff nunca assumiu posição inequívoca em relação à autonomia da política monetária. Todas as dúvidas são justificáveis e o tema ganha destaque, de novo, com declarações do presidente do PT, Rui Falcão, e do BC, Alexandre Tombini.

Neste mês, a primeira referência de Tombini ao assunto foi provocada por uma pergunta, no fim de uma palestra organizada pela Câmara Brasil-Israel de Comércio e Indústria. O BC, disse ele, precisa de autonomia, de direito ou de fato, para cumprir seu papel. A segunda referência, indireta, ocorreu na última quinta-feira, na abertura do seminário anual de metas de inflação. Depois de saudar os participantes, Tombini disse esperar uma contribuição do debate para o fortalecimento institucional do BC. Fortalecimento institucional, no Brasil, deve significar principalmente autonomia, de preferência, formal.

Dois dias antes, o presidente do PT, Rui Falcão, havia definido sua posição em uma entrevista. A formulação da política monetária, segundo ele, deve caber aos políticos eleitos. “O Banco Central tem autonomia operacional”, disse Falcão, “e achamos que a economia – e a questão monetária é parte da economia como um todo – precisa ser dirigida por aqueles que são eleitos. Eu sou contra a autonomia formal do Banco Central.”

A presidente Dilma Rousseff, assim como seu antecessor, Luiz Inácio Lula da Silva, também tem sido contrária à autonomia formal. Já havia declarado essa posição quando chefiava a Casa Civil. Mas o controle da inflação, durante os oito anos de Lula, só foi possível porque o BC, chefiado por Henrique Meirelles, agiu com suficiente independência operacional, combinada antes da instalação do governo petista em janeiro de 2003. Recém-eleita, Dilma Rousseff prometeu manter esse padrão. Seria reeditado com Tombini o compromisso de Lula com Meirelles.

Mas esse compromisso sempre foi observado muito precariamente. A presidente Dilma Rousseff permitiu-se opinar publicamente, com frequência, sobre a política monetária. Desde o começo, apontou a redução de juros como um objetivo de governo. No fim de agosto de 2011 o BC começou a reduzir os juros e manteve essa orientação até abril do ano passado. A presidente da República mais de uma vez mencionou essa mudança como uma das vitórias de seu governo – esquecendo sempre, é claro, de mencionar a inflação elevada e cada vez mais ameaçadora. Os dois fatos – o comportamento da presidente e a aparente submissão do BC à sua orientação – afetaram perigosamente a imagem da autoridade monetária.

O quadro começou a mudar há um ano, quando Tombini e seus companheiros decidiram enfrentar a inflação e iniciar um novo ciclo de alta de juros. Foi uma decisão importante para restabelecer a confiança na política monetária e consertar a imagem da própria instituição.

Ao defender a autonomia do BC, de fato ou de direito, o presidente Tombini mencionou, na palestra do começo do mês, o risco permanente de conflito entre objetivos de curto prazo do Tesouro e da autoridade monetária. Se quisesse alimentar um debate mais amplo, mais quente e mais realista, poderia ter mencionado o risco de conflito entre os objetivos eleitorais do governo e a missão de defesa do valor da moeda. Esse conflito é especialmente visível no Brasil e esse é o mais forte dos argumentos a favor da autonomia formal, definida em lei. Em democracias mais avançadas, esse caminho foi tomado há muito tempo.

Fonte: O Estado de São Paulo