Acordo Brasil-Israel torna-se protagonista para relação entre empresas de diferentes jurisdições
Desde que Oswaldo Aranha presidiu a Assembleia Geral da ONU que culminou na criação do Estado de Israel, o relacionamento entre Brasil e Israel passou a ser significativo e o laço entre os dois países vem sendo fortalecido no decorrer das últimas décadas.
Brasil e Israel realizam intercâmbio constante nas áreas técnica, científica e tecnológica, o que motivou, inclusive, a assinatura de diversos acordos, como o Acordo de Livre Comércio entre Israel e o Mercosul, em 2007, que tornou Israel o primeiro parceiro extra-regional a formalizar práticas de livre comércio com o bloco.
Entre outros aspectos, tal acordo implicou redução gradual das alíquotas do imposto de importação, aplicáveis no Brasil, sobre produtos importados de origem israelense, eliminando barreiras e facilitando a circulação dos bens dentro dos territórios dos países envolvidos. Mais de oito mil produtos israelenses foram beneficiados pela redução de alíquotas e considerando o constante desenvolvimento de novas tecnologias por Israel, o acordo pode ser visto como um instrumento benéfico à economia nacional.
A interação entre os dois países também ocasionou a criação da Câmara Brasil-Israel de Comércio e Indústria, cujos objetivos primordiais são o estímulo e a criação de oportunidades promissoras de negócios entre os dois países, bem como o de promover a atração de empresas e prestadores de serviços mediante comunicação entre diferentes setores.
Como dito, Israel é referência em tecnologia e profissionais de pesquisa e desenvolvimento, A recente aquisição do aplicativo israelense de mapeamento online “Waze” pelo “Google” é emblemática nesse sentido.
Num cenário em que um país vem se posicionando como exportador de tecnologia, não são raros conflitos de competência para a tributação da renda auferida em contratos que envolvem transferência tecnológica. Nesse contexto, convenções entre governos para evitar a dupla tributação da renda desempenham papel importante no estímulo de trocas comerciais e prevenção de possíveis conflitos de competência.
A Convenção Brasil-Israel, firmada em 2002, pode ser vista como instrumento de incentivo ao crescimento do intercâmbio de tecnologia entre os dois países. Principalmente ao limitar a 10%, em seu artigo 12º, a alíquota aplicável de IRRF sobre royalties não relacionados a uso de marca, em vez dos 15% geralmente aplicáveis. Trata-se, portanto, de estímulo para empresas israelenses que exportam tecnologia ao Brasil.
O artigo 23 da Convenção aborda os métodos a serem utilizados em cada jurisdição com o propósito de eliminar a dupla tributação. Caso um residente do Brasil receba rendimentos que sejam passíveis de tributação em Israel, o Brasil admitirá um montante igual ao imposto de renda pago em território israelense como uma dedução do imposto incidente sobre os rendimentos auferidos pelo residente fiscal no Brasil. Da mesma forma, Israel concederá aos seus residentes o valor correspondente ao imposto brasileiro pago sobre os rendimentos originários do Brasil como um crédito contra o imposto israelense, em um montante não superior ao imposto devido em Israel sobre tais rendimentos apresentados.
Entretanto, o protocolo do Acordo contém válvula de escape, de forma similar a outros acordos firmados pelo Brasil. Equiparam-se “rendimentos originários da prestação de assistência técnica e de serviços técnicos” a remessas efetuadas por royalties. Dessa forma, permite-se a tributação de remuneração pela prestação de serviços no Estado da fonte de pagamento, o que não seria possível caso fosse aplicável o artigo 7º do Acordo, referente a “lucros”, de acordo com a interpretação desse dispositivo aceita internacionalmente.
Apesar disso, o próprio protocolo devolve certa dose de otimismo ao ressalvar que, caso futuros tratados assinados pelo Brasil com países não situados na América Latina venham dispor de forma mais benéfica sobre assistência técnica e serviços técnicos, o mesmo dispositivo deve ser aplicado ao Acordo com Israel.
Com a latente expansão de empresas israelenses, é natural que os Estados envolvidos em trocas econômicas com Israel pretendam tributar a renda dessas operações. Instrumentos como o Acordo Brasil-Israel tornam-se protagonistas, desempenhando papel importante para que a interferência do Estado não represente desestímulo à interação entre empresas de diferentes jurisdições.
Por: Daniel Leib Zugman – Associado tributário do escritório Trench Rossi Watanabe, onde é membro de seu Israeli Desk. Mestre em direito e desenvolvimento pela Fundação Getúlio Vargas/SP
Artigo escrito para o Jota.info em 26 de setembro de 2017