A desconhecida Gazit avança no mercado brasileiro.

Quando os Estados Unidos viveram a “crise da poupança e do crédito” há cerca de três décadas, os bancos colapsaram e uma grande leva de imóveis foi a leilão. Os preços despencaram e os investidores, como é comum, entraram em pânico.

Mas, onde muitos enxergavam o caos, o advogado israelense Chaim Katzman viu uma oportunidade. Foi naquela época, em meio à crise, que ele comprou seus primeiros centros comerciais no sul da Flórida.

Seguindo essa estratégia de garimpar bons negócios mergulhados no caos, Katzman criou um grupo internacional dono de 561 shoppings, avaliados em US$ 22 bilhões, e com presença em 20 países.

A regra é ir às compras em momentos de fragilidade econômica, quando os concorrentes tiram o pé do acelerador. Agora, o alvo da Gazit-Globe é o Brasil.

A companhia, que já tem cinco empreendimentos no País, mas é até hoje desconhecida do mercado, quer ver o valor de seus ativos alcançar R$ 1 bilhão em dois anos.

Hoje, seus centros de compra em Caxias do Sul (RS), Campinas e Barueri, somados ao paulistano Morumbi Town, que está em construção, e ao prédio do Extra, no Itaim Bibi, estão avaliados em R$ 807 milhões.

Com esse portfólio, a participação brasileira no grupo ainda é muito pequena. Mas Chaim Katzman quer mudar esse cenário. Para isso, enviou ao Brasil seu braço direito, a israelense Mia Stark. Há um ano e meio no País, a executiva ainda não aprendeu a falar português, mas já mostrou a força de sua lábia.

Foi sob sua gestão que a companhia conseguiu avançar na compra de 70% do Extra do Itaim, onde o grupo planeja erguer um shopping no médio prazo(os outros 30% são da massa falida do Mappin, loja de departamento que antigamente ocupou o local).

Foi também ela que conseguiu convencer os gaúchos da família Zaffari – também desenvolvedora de shoppings – a levar sua rede de supermercados para o empreendimento que está em construção no Morumbi e deve ser inaugurado em 2016. Em geral, os supermercados Zaffari estão localizados em endereços de rua ou dentro de um de seus oito shoppings próprios, da bandeira Bourbon.

“Foram meses e meses de negociação”, diz Mia. A conquista foi emoldurada em um quadro com fotos na parede de sua sala, no escritório da Gazit, em São Paulo. Em uma das imagens, ela aparece ao lado de Claudio Luiz Zaffari. Em outra, exibe o contrato recém-assinado.

O negócio tem tudo a ver com a estratégia mundial da Gazit de investir em centros de compra com supermercados no papel de “âncoras”, em vez de grandes varejistas de moda. A visão do fundador é a de que, independentemente do ânimo da economia, as pessoas ainda vão ao supermercado.

Salões de beleza, lavanderia, academia e outros tipos de serviço também são aposta alta para o grupo. No caso do Morumbi Town, mais da metade da área será ocupada por serviços e entretenimento, segundo a companhia. A academia Bio Ritmo já está confirmada no shopping.

Levantamento da Associação Brasileira de Shopping Centers (Abrasce) referente ao mês de agosto mostra que o porcentual médio de área destinada ao segmento de lazer e entretenimento é de 8,42%. Já conveniência e serviços ficam com 6,8%.

“Existe uma tendência de investir em pontos de conveniência, aonde a pessoa vai para resolver a vida”, diz Michel Cuitait, especialista em shopping center e varejo e diretor executivo da consultoria Make it Work.

Exemplo disso no País é o Grupo Pão de Açúcar, que lançou recentemente o Conviva Américas, um shopping de vizinhança com 12,5 mil metros quadrados para locação que, além do supermercado, tem cinco lojas âncoras e 40 lojas menores. É o supermercado que gera o fluxo.

Centros urbanos

Foi pensando justamente em fluxo que a Gazit-Globe definiu como estratégia investir apenas em áreas extremamente populosas. “Nosso foco é a capital. Mundialmente, nossa tendência é ir para as áreas urbanas e densas, como San Francisco, Nova York, Washington”, diz Andres Andrade, diretor de novos negócios da Gazit.

A aquisição do Top Center Shopping, localizado na Avenida Paulista, por onde passam 1,5 milhão de pessoas diariamente, faz parte desse posicionamento. O centro comercial, de 6,4 mil metros quadrados, foi comprado da General Shopping em agosto por R$ 145,5 milhões.

A ideia da Gazit é fazer um “upgrade” no shopping, levando para lá marcas mais conhecidas, como a sorveteria Bacio di Latte e Temakeria e Cia. Outro plano é usar o topo do prédio para fazer um bar nos moldes do que o Hotel Unique tem em São Paulo. “Queremos encontrar uma forma de manter os executivos ali depois do expediente”, diz Mia.

Desafios

A tática de investir em centros urbanos populosos tem a vantagem de contar com vasta clientela em potencial ao redor do empreendimento. Do outro lado, existe o desafio da concorrência. A 500 metros do Morumbi Town está outro shopping, o Jardim Sul, da BR Malls. A Gazit diz que não vê problema porque sua proposta é diferente, mais concentrada em serviços.

O empreendimento Parque Global, do Grupo Bueno Netto, também promete um shopping em seu complexo que mistura torres residenciais e comerciais na Marginal do Pinheiros, a 5 quilômetros. “Vai ser difícil atrair lojistas (para o Morumbi Town)”, diz um especialista do setor. “Mas a gente pode se surpreender.”

Outra dificuldade para empresas com o perfil da Gazit (que preferem comprar empreendimentos prontos) é encontrar pontos disponíveis e negociá-los. Mas o grupo israelense sabe disso.

No pequeno caderno de apresentação da empresa a investidores, a empresa destaca que atua em “áreas fortemente urbanas com altas barreiras de entrada” – estratégia adotada globalmente há cerca de três anos.

Antes disso, a empresa investia também no interior – o que explica o centro comercial comprado em Caxias do Sul (RS) pelo antigo presidente no Brasil.

“Não espere que a Gazit vá para fora de São Paulo”, diz Mia. É na badalação da capital paulista que a executiva pretende retribuir a confiança do chefe e fazer com que o Brasil deixe de ser um pontinho quase imperceptível no mapa de atuação da gigante israelense.

Fonte: Exame